
Dados os acontecimentos da última semana, num cenário que, para a maioria das pessoas, parecia inicialmente pouco provável ou até mesmo impossível, é natural que muitos de nós estejam atualmente a manifestar várias emoções negativas, como o medo e a tristeza, bem como sinais de ansiedade e de stress, que estão a comprometer o nosso bem-estar a vários níveis e o nosso funcionamento habitual nos vários papéis que desempenhamos.
De facto, para quem só conhece a paz, que é um cenário comum para muitas pessoas, pois nasceram e viveram em paz durante todos estes anos, torna-se bastante difícil gerir estas questões ligadas a conflitos de guerra, como a violência, a destruição, a crise humanitária, bem como outras consequências que se verificarão a curto, médio e longo prazo como, por exemplo, as dificuldades e perdas económicas ligadas às nossas vidas diárias.
Neste sentido, é importante tentarmos gerir estas emoções negativas que, apesar de naturais e expectáveis dado o momento em que nos encontramos, se podem tornar avassaladoras e comprometer seriamente o nosso funcionamento e a nossa capacidade de cuidarmos daqueles que dependem de nós, como as crianças, os idosos e os nossos animais de estimação. De facto, a guerra pode afetar significativamente aquilo que pensamos e sentimos, principalmente quando falamos de crianças ou jovens, mesmo com milhares de quilómetros de distância, podendo influenciar negativamente a visão que temos do mundo de um lugar seguro.

Posto isto, podemos começar por legitimar a nossa própria ansiedade.
Por outras palavras, podemos começar por pensar que sentir ansiedade é natural tendo em conta os conflitos que temos presenciado nos últimos dias e, principalmente, após uma crise pandémica que ainda se mantém após dois anos e que trouxe consigo várias exigências, adaptações e consequências para a vida da maioria das pessoas e que ainda hoje se verificam.
De facto, estes contextos de crise geram algumas incertezas e sentimentos de impotência pela sua natureza imprevisível, e estas dúvidas impactam-nos a nível físico, psicológico e emocional, podendo mesmo desenvolver e agravar condições e sintomatologia ligada ao stress, ansiedade e até mesmo depressão.

Assim sendo, pode ser feita uma gestão mais adequada do medo, da ansiedade e dos sentimentos de impotência se nos concentrarmos naquilo que podemos controlar.
Por outras palavras, podemos procurar meios concretos de ajudar como, por exemplo, através de comportamentos pró-sociais, como o ativismo e/ou manifestações sociais ou através da angariação e/ou contribuição de provisões junto das associações humanitárias que estão a colaborar a nível nacional. Estas ações de solidariedade permitem-nos minimizar alguns pensamentos e sentimentos negativos, dando-nos algum conforto e esperança.
Por outro lado, é também importante direcionarmos a nossa atenção para aqueles que dependem de nós. Isto é, se para os adultos a exposição a conteúdos relacionados com a guerra e crise humanitária originam sensações de inquietação e medo, para as crianças e jovens pode causar terror, principalmente porque, frequentemente, nem compreendem bem os acontecimentos, podendo gerar angústia, confusão e medo. Por estes motivos, é importante falar com as crianças ou jovens sobre os conflitos, tentando perceber de que forma estão expostos à informação e aquilo que pensam e sentem sobre isso, e transmitir-lhes informação adequada à sua idade, capacidade de compreensão e vivências, tentando assim minimizar alguns efeitos psicológicos e emocionais negativos resultantes da exposição, bem como reforçar as suas sensações de segurança e de proteção. Para mais informações, consulte o documento elaborado pela Ordem dos Psicólogos Portugueses intitulado “Conversar sobre a guerra: Perguntas e respostas para pais e cuidadores de crianças e jovens”.
A nível pessoal, é importante estarmos informados (escolhendo fontes de informação credíveis, neutras e transparentes), mas com alguma moderação. Ou seja, é importante sabermos desligar de vez em quando, disponibilizando alguns momentos do dia para esse fim, pois a exposição em demasia à informação pode levar a que algumas pessoas se sintam angustiadas e oprimidas.
Do mesmo modo, é fundamental monitorizar aquilo que sentimos face aos eventos atuais, partilhando com as pessoas de quem gostamos e/ou em quem confiamos os nossos pensamentos e sentimentos. Para além da libertação e da validação de determinados pensamentos e sentimentos negativos, este exercício permite-nos trabalhar outras formas de lidarmos e gerirmos as nossas emoções e pensamentos associados e evitar que se convertam em comportamentos desadequados ou agressivos. Não devemos ter vergonha de admitir que estamos ansiosos, preocupados ou com medo, ou que precisamos de ajuda profissional para lidarmos com aquilo que estamos a sentir, seja qual for o contexto, mas principalmente tendo em conta tudo aquilo que temos presenciado ultimamente.
Adicionalmente, é fundamental não desvalorizarmos o nosso autocuidado, pois para cuidarmos dos outros, precisamos de cuidar de nós primeiro. Deste modo, devemos reservar sempre algum tempo e espaço no nosso dia-a-dia para realizarmos atividades que contribuam para manter ou aumentar o nosso bem-estar e a nossa Saúde Psicológica, assim como para reduzir o stress e a ansiedade e para gerir de um modo mais equilibrado os desafios diários.

Por fim, podemos, ainda, aproveitar este período para desenvolver a nossa capacidade de sermos solidários e de sentirmos empatia e compaixão pelos outros (e por nós próprios), o que nos permite obter algum conforto e bem-estar, do mesmo modo que alimenta a nossa esperança de que um dia tudo ficará melhor.
Referências:
Durães, M. (2022, 24 de fevereiro). Como posso controlar a ansiedade que o início de uma guerra me faz sentir? Disponível em: https://www.publico.pt/2022/02/24/p3/noticia/controlar-ansiedade-inicio-guerra-faz-sentir-1996709 (02.03.2022).
Ordem dos Psicólogos Portugueses (2022). Conversar sobre a Guerra: Perguntas e respostas para pais e cuidadores de crianças e jovens. Disponível em: https://www.ordemdospsicologos.pt/ficheiros/documentos/doc_perguntas_respostas_guerra.pdf (02.03.2022).
Ribeiro, C. B. (2022, 24 de fevereiro). Para os mais jovens, a ideia de guerra pode ser uma tormenta – a resposta é escutá-los. Disponível em: https://www.publico.pt/2022/02/24/impar/noticia/jovens-ideia-guerra-tormenta-resposta-escutalos-1996698 (02.03.2022).
Fotografias por ordem de visualização: Matti, Katie Godowski, Juan Pablo Serrano Arenas & RODNAE Productions.
