Guerra na Ucrânia: gerir emoções e sentimentos em contexto de crise

Após dois anos de pandemia por COVID-19, juntamente com a crise social e económica que dela decorreu, eis que nos defrontamos com uma guerra e com todas as consequências nocivas que lhe estão associadas. Estes eventos, pela sua natureza imprevisível, contribuem para aumentar de forma significativa os nossos sentimentos de incerteza e de insegurança. Adicionalmente, esta constante exposição a momentos de crise agrava os nossos sentimentos de vulnerabilidade, levando a que nos sintamos exaustos e desesperados, o que acaba por degradar a nossa saúde psicológica e o nosso bem-estar.

De facto, para a grande maioria das pessoas, é muito complicado não se sentirem preocupadas e perturbadas perante uma situação de guerra e uma crise humanitária, principalmente, quando são confrontadas diariamente com conteúdos sobre destruição, violência, desrespeito pelos direitos, dignidade e integridade das pessoas, bem como com imagens que demonstram o sofrimento e o desespero pelo qual estão a passar as pessoas e os animais que estão a lutar pelas suas vidas. Efetivamente, para a maioria das pessoas, é muito complexo tentar encontrar um sentido para esta situação que nos impressiona e consideramos ilógica.

Assim, mesmo a milhares de quilómetros, é praticamente inevitável que não sintamos compaixão e empatia por estas pessoas, que são iguais a nós, assim como sentimentos de choque e de revolta, por terem de passar por estes momentos aterradores. Portanto, a guerra acaba por afetar-nos a todos de forma direta ou indireta pela sua complexidade, podendo mesmo comprometer a nossa gestão emocional em relação a tudo aquilo que temos vindo a sentir nos últimos tempos.

É natural que possamos sentir alguma preocupação, stress, ansiedade, tristeza, medo e angústia, bem como irritação e/ou impotência, ou até mesmo alguma apatia e choque perante tudo aquilo que temos presenciado. Do mesmo modo, podemos ainda apresentar alguma dificuldade em dormir, em concentrarmo-nos e/ou em tomar decisões.

Posto isto, esta sobrecarga emocional, associada ao carácter imprevisível das crises, pode suscitar algumas inseguranças e dúvidas em relação ao futuro, pela noção que temos de perda de controlo sob as circunstâncias e/ou pelo impacto que as dificuldades socioeconómicas terão nas nossas vidas.

Por outro lado, as pessoas que têm família e/ou amigos na Ucrânia ou na Rússia poderão ser impactadas em maior grau a nível emocional, tal como outras pessoas que se encontram atualmente em posições de maior vulnerabilidade ligadas a aspetos socioeconómicos como, por exemplo, o desemprego e/ou precariedade, o estigma e/ou exclusão social ou a pobreza, podendo levar ao aparecimento e/ou aumento de dificuldades e/ou problemas de saúde psicológica (p. ex. ansiedade, depressão).

“Parem a guerra”.

Possivelmente, não dependerá de nós a modificação do rumo dos eventos mundiais, contudo, a forma como lidamos e reagimos perante estes momentos de crise pode ser gerida por nós. Ou seja, podemos escolher tentar adaptarmo-nos e gerir os nossos pensamentos e sentimentos da melhor forma que nos for possível e ajudar ou contribuir com aquilo que podemos.

Algumas sugestões que poderá experimentar para lidar de um modo mais adequado com aquilo que tem sentido nas últimas semanas são:

  • Diminuir a exposição em demasia a notícias e consultar sempre fontes credíveis de informação;
  • Aceitar as suas emoções e sentimentos e possíveis variações de humor e/ou de motivação que possa apresentar durante este período;
  • Partilhar o que pensa e sente com familiares ou amigos em quem confia;
  • Fortalecer as suas ligações e relações com as pessoas de quem gosta;
  • Investir em atividades de autocuidado e em estratégias de gestão da ansiedade e/ou stress;
  • Vigiar a sua saúde psicológica e bem-estar, observando atentamente o aparecimento de indícios e/ou comportamentos em si mesmo/a e nas pessoas que o/a rodeiam de que “algo não está bem”;
  • Viver no presente, um dia de cada vez, tentando desenvolver e reforçar a sua capacidade de adaptação e a sua resiliência perante as mudanças e os desafios que estes momentos de incerteza lhe trazem;
  • Encontrar meios de ajudar (p. ex. donativos, mobilização e articulação de recursos e/ou de pessoas), o que pode ajudá-lo/a a encontrar um sentido e/ou um objetivo e contribuir para aumentar a sua perceção de controlo perante estes momentos de crise que nos encontramos.

No documento intitulado “A guerra afecta-nos a todos – gerir emoções e sentimentos em situações de crise”, poderá encontrar mais sugestões e detalhes que o/a poderão ajudar a lidar com aquilo que sente neste momento.

Em todo o caso, alimentar a esperança perante um contexto social e económico adverso pode ajudar a aliviar e a combater o sofrimento psicológico que cada um de nós poderá sentir neste momento. Infelizmente, não será suficiente para alcançar o equilíbrio psicológico, mas poderá favorecer consideravelmente o alcance do mesmo.

No entanto, se sentir que não está a conseguir gerir adequadamente os seus pensamentos e sentimentos e/ou se aquilo que está a sentir e a pensar estiver a comprometer de modo significativo o seu funcionamento quotidiano, ou seja, os seus hábitos de sono e/ou de alimentação, a sua capacidade de realizar adequadamente as suas tarefas diárias, de cuidar de si mesmo/a a vários níveis e/ou de se relacionar com as outras pessoas, deve procurar ajuda profissional.

Um/a Psicólogo/a pode ajudar-nos a lidar com experiências de vida difíceis (atuais ou passadas) e a compreendermos os nossos pensamentos, sentimentos e comportamentos. Por outro lado, pode ajudar-nos a arranjarmos estratégias mais adaptativas para lidarmos com esses mesmos pensamentos, sentimentos e comportamentos quando estes comprometem o nosso funcionamento diário e as nossas relações interpessoais e, consequentemente, a nossa saúde psicológica e o nosso bem-estar.

Cada um de nós, por diferentes razões e em fases distintas da sua vida, pode tirar algum proveito de ser acompanhado por um/a Psicólogo/a, e isso não é motivo de vergonha.

Pedir ajuda nunca é um sinal de fraqueza, mas sim de coragem e responsabilidade.”

Ordem dos Psicólogos Portugueses, 2022

Referências:
Carqueja, R. (2022, 2 de março). Psicologia em Tempo de Guerra: A Guerra e o Medo. Disponível em: https://cnnportugal.iol.pt/ucrania/eduardo-carqueja-psicologia-em-tempo-de-guerra-a-guerra-e-o-medo/20220302/621e73700cf2cc58e7e60904 (21.03.2022).
Carvalho, R. G. (2022, 26 de fevereiro). Psicologia em Tempo de Guerra: Domínio, identidade, (des)ânimo?. Disponível em: https://cnnportugal.iol.pt/ucrania/renato-gomes-carvalho-psicologia-em-tempo-guerra-dominio-identidade-des-animo/20220226/62192eee0cf2c7ea0f1b89f7 (21.03.2022).
Ordem dos Psicólogos Portugueses (2022). A GUERRA AFECTA-NOS A TODOS – Gerir emoções e sentimentos em situação de crise. Disponível em: https://www.ordemdospsicologos.pt/ficheiros/documentos/opp_aguerraafecta_nosatodos.pdf (21.03.2022).

Fotografias por ordem de visualização: Katie Godowski, Mathias P.R. Reding, SHVETS production.

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